A tradição do Natal açoriano
"O Menino mija", que junta grupos em peregrinação por casas de amigos
e familiares, tem perdurado no tempo, constituindo um símbolo do património
etnográfico do arquipélago.
“Há tradições que têm vindo a
sofrer uma quebra ao longo do tempo, mas sociologicamente esta é uma tradição
que perdura no tempo e acredito que irá perdurar, porque envolve o convívio e a
proximidade das pessoas numa quadra natalícia que assim se propicia. Acredito
que por haver mais disponibilidade das pessoas e mais sensibilidade há esse
tipo de interação”, afirmou o sociólogo Miguel Brilhante, em declarações à
Lusa.
Entre o dia 24 de Dezembro e o de
Reis (06 de Janeiro), vários grupos de homens e mulheres andam de casa em casa
visitando familiares e amigos e degustando doces e licores tradicionais, que
estão sempre expostos por esta altura nas mesas.
Antes de entrarem, e chegados a
estas casas, os grupos perguntam: "O Menino mija?".
“Pode parecer estranho o termo
para as pessoas mais leigas na matéria, mas esta frase ou a célebre pergunta
nas casas das pessoas acaba por ser uma forma de abrirem as suas portas e
partilharem o que têm nesta época natalícia”, explicou Miguel Brilhante,
acrescentando que esta visita às casas, desde o Natal até aos Reis, acaba por
ser a receção de amigos e familiares que muitas vezes não têm lugar à mesa no
Natal, por ser mais restrito à família.
Acaba por “haver sempre algo para
oferecer nestas casas” e “há sempre algo para partilhar”, disse ainda o
sociólogo, lembrando que nas mesas, além dos "licores e dos figos
passados", estavam sempre presentes "as laranjas, uma tradição que
terá advindo da importância" do citrino nas ilhas em meados do século
XVIII e XIX, durante o próprio "ciclo da laranja, tão característico dos
Açores".
"Há sempre uma porta aberta
e algo para partilhar, o que significa que o contexto em que Jesus Cristo
nasceu acaba por ter aqui um simbolismo muito evidente na forma como se
transporta para este tipo de tradição", realçou.
Em todas as casas,
"independentemente dos seus contextos sociais, há sempre alguma coisa para
partilhar" e, segundo o sociólogo, esta é "uma daquelas tradições que
se expande sem data marcada".
“Não prevejo que seja uma
tradição que esteja suscetível de sofrer alguma quebra, pelo contrário, julgo
que nos tempos que correm é uma tradição que se irá fortificar muito mais”,
referiu.
O mundo rural "orgulha-se de
manter viva" esta tradição, mas nas freguesias e centros urbanos também se
ouve por esta altura do ano a célebre pergunta: "O Menino mija?".